Eu sou muitas coisas, e principalmente sou o lugar que habito.


 Eu costumava adorar mudanças, transformar o velho em algo inovador fazia os meus olhos brilharem, deixavam uma excitação pairando no ar, renovava as minhas forças, lembro-me de que sempre quando algo não ia bem, caía na rotina, eu ia lá e cortava  a minha franja, as vezes sozinha ou no salão, eu picava o cabelo todo num corte bem chamativo, era o meu jeito de impulsionar as coisas para se modificarem. Era tão simples, trocar as coisas de lugar no meu quarto, pintar a parede de outra cor, essa era a minha maior preocupação. Hoje é bem diferente, qualquer certeza que eu mudar de lugar pode ter proporções cósmicas! 

É isso que tenho sentido nos últimos oito meses, desde quando tive a brilhante ideia de mudar de casa, porque até precisava, porém eu não fui mais criteriosa na escolha do novo lugar, já constatei que na casa antiga meus dias internos já não eram mais os mesmos, porém, ela me trazia algum alento, já onde estou hoje não temos nem melhora nem alento, na terapia foi ressaltado que o fato de me mudar de um lugar por incomodo psicológico, poderia acarretar na criação de algum tipo de pré-conceito, de estigma, e o meu maior erro foi pesquisar no Google, se era normal a gente se mudar por desconforto psicológico, e ele me informou que poderia ser ate algum tipo de TOC desenvolvido. 

Só sei que eu montei um circo em volta dessa mudança, planeei e planejei tudo, convenci o marido de que era o melhor (continuo acreditando que era o melhor sair de um lugar cheio de mofo e infiltração) porém, eu poderia ter sido mais cuidadosa com a escolha, e considerar outros desconfortos que tudo poderia acarretar, o fato de me sentir 100% exposta porque é uma casa de segundo andar sem janelas planejadas, e com um vizinho de frente extremamente curioso, com uma laje que denuncia cada passada que eu dou, mas no calor da escolha foi o lugar com custo-benefício mais charmoso que encontrei, e um que o esposo aprovava.

Organizando toda essa confusão em parágrafos percebo que tenho jogado a culpa de toda essa desgraça imobiliária sobre minha cabeça, porém a decisão não foi só minha de escolher o lugar que estamos hoje, só que as coisas que profundamente me incomodam são irrelevantes para o meu companheiro, então não há bem quem culpar, eu só queria que esse alarme na minha cabeça desligasse, esse grito que dá toda vez que tenho que entrar em casa, essa vontade de por tudo numa caixa de papelão e sumir. 

E há aqueles raros dias, em que eu acordo conformada com tudo e penso "Sei que isso aqui não é eterno, mas vai durar um bom tempo ainda, preciso me acostumar" ou "Até que daqui tem uma vista linda do pôr-do-sol. Mas a saudade de ter mais privacidade e de poder faxinar a minha casa até tarde da noite, sem me preocupar se vou acordar os vizinhos de baixo está me consumindo! O desejo de ter a minha vida menos circundada de olhares é crescente e latejante em meu coração, eu sou muitas coisas, e principalmente sou o lugar que habito.


Comentários

Postagens mais visitadas