A Fênix que mora na rotina de cada um


Não há nada mais nocivo para mim, do que rotina, deviam dar esta palavra como nome de algum veneno, que lentamente obstrui toda criatividade, liberdade e ânimo de viver das pessoas. Lentamente fui construindo essa gaiola mim, presa entre uma tarefa e outra, enquanto o papel e a caneta inseparáveis dos dedos das minhas mãos, ia empoeirando num canto da mesa, a câmera bem carregada não captura nenhum sorriso há meses, nunca sobrava um momento se quer para eu exercitar o que é ser eu mesma, com a minha bagunça diária, com as minhas coisas; perdoem tantos pronomes possessivos, mas é só a minha maneira de desfrutar minha companhia que havia sido sequestrada pela correria diária.

Andava pela casa em rotas gastas, acordar com o primeiro alarme, sentir o dolorido nos olhos pelas poucas horas de sono, colocar soneca, uma, duas, três vezes e levantar em cima da hora, como se estivesse indo pro matadouro, pegar a primeira roupa que ver pela frente, escovar os dentes, lavar o rosto, não necessariamente nessa mesma ordem, todos os dias. Certa vez conversando com um amigo, eu perguntava: "Por que, sendo a vida tão curta, nos privamos dos pequenos prazeres, para viver em infernos particulares?" "Precisamos suportar", ele apenas respondeu depois de uma longa pausa, como se lembrasse de todas suas lutas, o que não me satisfez saber, pois sou do tipo que sempre quer mais da vida.

Deve haver um plano b, uma saída de escape, alguma coisa que nos arranque dessa mesmice cruel e cinzenta de todos os dias, aposto que essa força invisível, deve morar em algum lugar dentro de nós, bem lá no íntimo, bem atrás daquelas toneladas e  toneladas de frustrações e medos. E como cheguei até ela? Morri várias vezes, para muitos hábitos que drenavam a minha vontade de viver, eu errei e recomecei todos os dias, até conseguir remover todo esse medo do fracasso, todas essas frustrações que me separavam da minha coragem, as vezes precisamos podar pedaços de nós mesmos, para dar espaço para que outros floresçam, mais viçosos e bem melhores.

Toda rotina possui uma Fênix libertadora, sim, é essa força invisível dentro de você mesmo, tem horas que precisamos vir às cinzas para poder renascermos melhores e mais fortes, não tenha medo de morrer todos os dias, mas morra pelas coisas certas, morra para velhos hábitos ruins, para algumas certezas corrosivas, e até mesmo para algumas pessoas destrutivas, se reinvente, de novo e de novo. Farta daquele meu inferno particular, arranquei o blackout da cortina, desativei a função soneca, e a ausência de um sorriso no meu rosto, abracei sem medo as mudanças, joguei fora as certezas, e hoje, alimento e bem, a minha Fênix, não quero que ela vá embora, a não ser o dia em que recomeçar seja novamente necessário.

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